Tuesday, August 3, 2010

Gente Humilde


Pois é, há muito tempo que não posto nada aqui. Ando meio decepcionado com minha criatividade, desconfio que estou muito mais burro do que costumava ser e o pior de toda essa história é que nem estou tão preocupado assim em sanar esse problema. Inclusive eu duvido muito que esse texto alcance um nível aceitável, mas eu preciso mesmo registrar algumas impressões que tive hoje.

Hoje foi meu primeiro dia de trabalho como recenseador do IBGE para o Censo Demográfico 2010. Nunca foi exatamente o concurso que sonhei passar, me inscrevi bem por acaso, de última hora e fiz a prova com a mesma empolgação que recebi o resultado dela: muito pouca. Eu realmente não achava muita graça, pouca grana, muito trabalho e temporário... o emprego público que nunca quis desempenhar. Só aos poucos fui me conformando com a situação, afinal cavalo dado não se olha os dentes, não é mesmo? Pra alguém mergulhado no mais profundo ócio, foi bastante cansativo, mas à medida que ia entrevistando de casa em casa, pude notar alguns aspectos interessantes do ser humano que eu nunca tinha atinado antes e é sobre um desses mesmos aspectos que divago nas próximas linhas.

Sinto-me tentado a acreditar que os adeptos da teoria de Rosseau estão certos afinal: "o homem é bom, a sociedade é que o corrompe". É sério; você, assim como eu antes, sabe que muita gente vive com pouco, quase na miséria, mas acredite, ver e registrar aquela situação te faz enxergar realidades tão diferentes da nossa que não estão nem a 3 ou 4 quarteirões de distância.

Se chegar na casa de uma pessoa com menos condições financeiras, na maioria das vezes você será recebido como um amigo, tratado com respeito incomparável e servido do melhor que há na residência. O melhor que há na casa pode ser até um pedaço de bolo, um doce ou uma xícara de café, que pra você talvez pareça pouco, mas a maioria sobrevive com 510 reais e uma ajudinha do bolsa-família, com uma família inteira e às vezes até famílias alheias pra sustentar.

Um salário-mínimo não dá pra comprar maquiagem, nem dar-se ao luxo de pagar a academia, mas você caçoa da menininha que sai do bairro da periferia ou do sítio longínquo porque ela é "sem-sal", não tem aquele bumbum empinadinho nem as coxas bem torneadas. Um salário-mínimo dá pra adquirir uma moto com 10 anos de uso quando aquele pai de família sacrifica um pouco do que ganha, uma parte do que leva o ano inteiro pra colher, durante tantos anos a fio pra poder comprá-la, e quando ele dá uma volta na rua com a mulher e o filho na garupa, nós supostamente civilizados, ridicularizamos sua condição. Porra, isso tudo parece tão clichê, né? Quer dizer, todo mundo fala isso, jornais e documentários mostram essa realidade, e você até se emociona, fica indignado, revoltado, mas esquece no dia seguinte ou não tem noção verdadeira disso.

A humildade, pra mim, é uma das coisas mais bonitas e raras que pode aflorar na alma de um ser humano. É a mais pura e singela expressão da bondade e do altruísmo humano. A maioria dessas pessoas respeitaram tanto a mim, sem fazer a menor idéia de que são muito mais dignas do que eu na maioria dos casos. Dá pra sentir bondade sincera nas feições e no tom de voz delas, não há pretensão na forma que conversam.

O homem corrompido pela vida implacável da sociedade moderna não só costuma desprezar esses valores como tenta ganhar vantagem e acha-se superior ao homem naturalmente bom. Nesses próximos meses veremos muitos exemplos de homens assim aclamados em via pública, televisão e jornais. Eles são os reflexos da nossa sociedade que preconiza o mais esperto e valoriza aquele que tem mais. Vejo, na minha realidade, conhecidos meus que discutem do lado de um paredão e de um carro rebaixado, quem é mais rico e portanto tem direito de ligar o seu som. Depois encontro outros dois na mesa de um bar, quase indo às vias de fato porque um deles duvidou que o outro tivesse condições de pagar a garrafa de Whisky que estava sendo tomada e a escondeu.

Sem dúvida a pobreza que mais envergonha a raça humana continuará sendo a de espírito enquanto vivermos no mal necessário chamado sociedade. É, Chico, sinto assim todo meu peito se apertar, mas é pela gente esnobe mesmo... que vontade de chorar por ela.

4 comments:

ANNA P.M.S. said...

Ursinho... adorei seu texo e concordo em tudo... só não pelo fato que você é burro, pois burro você nunca foi! Também trabalho com a comunidade pelo pojeto da universidade e percebi os pontor que destacou, existe gente humilde e com muita humildade na alma.
Gente rica muitas vezes é pobre de espírito.
Se cuida viu? beijão

Unknown said...

Você realmente, tem o dom de se expressar, com tanta sabedoria, com tanto recurso que pude notar ao ler este texto, ainda designa-se burro? Desculpa, eu não acho!
Muita sinceridade, mesmo sabendo que a nossa realidade hoje em dia é esta...
Parabéns! Texto digno de uma muitas palmas.
Beijão Ruffys.

Karol Marques' said...

Meu querido suas palavras tocaram fundo. Pois é, deprimente a situação de muitas pessoas que vivem no nosso país, uma realidade cruel que muitos de nós imaginamos, porém não chega nem perto do que essas famílias viveciam. Parabéns pelas singelas e simples palavras. Saudadiiis Poeta Burro =D Te amo

waleska blogs said...

Parabéns jovem, vc conseguiu realmente descrever o que é a maior pobreza. A pobreza de espírito nos rodeia até mais do que a financeira e de fato, ela é a que envergonha o ser humano, tão fútil, tão superficial e tão limitado.
Continue com postagens dessas, elas são interessantes e transmitem uma menssagem bem produtiva.