Saturday, November 6, 2010

Piada de brasileiro

Já há algum tempo eu queria falar sobre isso. O assunto é um pouco antigo mas me veio à cabeça recentemente durante uma discussão com meu pai, achei interessante compartilhá-lo com os interessados em saber minha opinião.

Recordávamos o conhecido episódio da declaração do ator Robin Willians no talk show de David Letterman. Na ocasião, Willians fez uma piada em rede nacional nos EUA onde dizia que o Brasil ganhara o direito de sediar os Jogos Olímpicos de 2016 porque enquanto eles haviam levado Obama e Oprah, nós mandamos pra decisão do comitê um punhado de prostitutas e meio quilo de pó. Todos lembram como essa piada foi tida como grosseira e preconceituosa, gente se declarando decepcionado com o ator/humorista, inclusive declarando nunca mais entrar numa sala de cinema em que esteja sendo exibido um filme estrelado por ele (dentre eles meu pai).

Não vou entrar na discussão do óbvio. Toda discriminação, seja lá que  conotação tenha, é retrógrada e reprovável. Discuto aqui, tão somente, duas questões sobre esse assunto que a mim parecem -me relevantes. 

A primeira delas é o discernimento, a identificação da linha tênue que separa a piada e o humor da discriminação e do preconceito. As piadas, em sua grande maioria, nada mais são do que caricaturas. Quando se faz a caricatura de alguém, recorta-se um defeito ou algum traço exótico que possa ser propositalmente generalizado ou aumentado de forma a tornar-se cômico. Alguém que tem um nariz grande, será desenhado com um nariz desproporcional que deformará um pouco suas feições com o objetivo de tornar o retrato engraçado.

Na piada, os defeitos e as mazelas de um grupo social ou até mesmo de um povo são destacados com o propósito de fazer rir. Nos EUA, os negros fazem piadas de negros, judeus fazem piadas de judeus. No Brasil, predominantemente católico, faz-se piada com padres pedófilos, que fazem sexo com freiras e daí por diante. É saudável rir-se do ridículo e ironizar o mundo que nos cerca. Ora, como se espera que um humorista profissional seja ponderado ao fazer o mesmo? Como exigir que o humor seja limitado ao ponto de perder sua própria característica de sátira do cotidiano? Pra mim se configura uma atitude de autoritarismo num mundo que preconiza a liberdade de expressão e a democracia.

A segunda questão que se põe é a sensibilidade do brasileiro quando se fala dos problemas sociais que temos. O brasileiro adora tirar sarro dos outros, contar piada, levar vantagem e se vangloriar da malandragem sobre os outros povos, mas há uma relutância em aceitar críticas e anedotas vindas de fora. 

Quantas vezes você escutou um amigo contar uma piada de português e riu-se da imagem estereotipada do padeiro estúpido de bigode que sempre é passado pra trás pelo brasileiro espertalhão? Já ouviu alguém fazer chacota da situação miserável dos africanos? É engraçado zoar alguém e dizer q ele tá mais magro do que um morto de fome da África, né? Que "fulano" tem o "pau" pequeno como o de um japonês etc. Mas ninguém parece defender a ética e pregar a moral nessas ocasiões.

Em ambas as questões é possível notar mais um defeito que talvez Willians tenha esquecido de zombar: a hipocrisia em que estamos mergulhados. Em lugar de lutarmos pra desfazer esse estereótipo maculado que os "gringos" tem de nós, estamos nos ressentindo com a crítica. É aquela velha mania de culpar os outros pelos nossos problemas. Enquanto vivermos afundados nessa hipocrisia, não saberemos reconhecer os nossos defeitos, consequentemente nao conseguiremos arranjar soluções para os mesmos.


Mas talvez isto esteja pra mudar, de lá pra cá muita coisa mudou e provamos ao mundo que não nos importamos que zombem de nós, e provamos com ironia invejável. Agora fazemos nossas próprias piadas, rimos de nós mesmos nas eleições desse ano, elegemos um palhaço para a Câmara, eis a mais fiel caricatura de nossa própria hipocrisia. Piada de brasileiro é engraçada, né? kkkkkkk

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